Panorama verde: um paralelo entre a vegetação da cidade moderna e da contemporânea

Categoria: Sustentabilidade Escrito por Matheus Maramaldo Andrade Silva

MATHEUS MARAMALDO ANDRADE SILVA

Resumo:

O verde, configurado a partir de árvores, arbustos, forrações e demais estratos, tem um diálogo variado dentro da paisagem. Em uma perspectiva mais associada a sua essência stricto sensu, é captado pela lente dos observadores como parte da “mãe natureza”, onde o compêndio geográfico e as raízes rousseauneanas fatalmente nos enveredam para uma análise pastoril da vegetação, para a densidade das imensidões vegetadas ou os detalhamentos específicos da botânica, em que cada elemento fitofisiológico ou fitomorfológico é essencial.

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Arquitetura, contracultura e sustentabilidade: Parte 3

Categoria: Sustentabilidade Escrito por Edite Galote Carranza

Contracultura, composição: Fonte. Edite Galote Carranza

 EDITE GALOTE CARRANZA

A partir dos anos de 1960, uma nova forma de pensar a arquitetura surge à medida que as críticas ao Movimento Moderno se multiplicam. Vários autores foram responsáveis por esses questionamentos, tais como: Kevin Lynch com The image of the city, em 1960; Giulio Carlo Argan com Progetto e destino, em 1964; Aldo Rossi com  Larchitecttura della cittá, em 1966; Robert Venturi com Complexity and Contradiction in Architecture, em 1966; Manfredo Tafuri com Teoria e storia dell’architettura, em 1968, entre outros.

A onda de questionamentos ao Movimento Moderno coincide com o período de grandes mudanças sociais que se originaram no movimento de Contracultura, definido na seção anterior. A Contracultura, e seus desdobramentos de pensamento, lançaram um caminho alternativo ao mundo “Tecnocrático Moderno” de então. Um caminho de maior liberdade e busca da valorização das individualidades, e neste caminho não havia mais espaço para um “Estilo Internacional” na arquitetura.

O geógrafo David Harvey estabelece o ponto de contato entre o movimento de Contracultura e o período de questionamento do Movimento Moderno amplo, em suas palavras:

[...]Foi nesse contexto em que os vários movimentos contraculturais e antimodernistas dos anos 60 apareceram. Antagônicas às qualidades opressivas da racionalidade técnico-burocrática de base científica manifesta nas formas corporativas  e estatais monopolíticas e em outras formas de poder institucionalizado (incluindo as dos partidos políticos e sindicais burocratizados), as contraculturas exploram os domínios da auto-realização individualizada por meio de uma política distintivamente “neo-esquerdista” da incorporação de gestos antiautoritários e de hábitos iconoclastas (na música, no vestuário, na linguagem e no estilo de vida) e da crítica da vida cotidiana. Centrado nas universidades, institutos de arte e nas margens culturais da vida na cidade grande, o movimento se espraiou para as ruas e culminou numa vasta onda de rebelião que chegou ao auge em Chicago, Paris, Praga, Cidade do \México, Madri, Tóquio e Berlim na turbulência global de 1968. Foi quase como se as pretensões universais de modernidade tivessem, quando combinadas como o capitalismo liberal e o imperialismo, tido um sucesso tão grande que fornecessem um fundamento material e político para um movimento de resistência cosmopolita, transnacional e, portanto, global, à hegemonia de alta cultura modernista.” 1

O crítico literário e estudioso da cultura contemporânea Fredric Jamenson argumenta que, naquele momento histórico, havia um momento de “libertação universal” onde “tudo era possível”, ou seja, uma libertação de energias sociais e uma “prodigiosa e escapada de forças não teorizadas”. No caso, ele se refere aos movimentos contraculturais em prol das minorias étnicas, negros, ecologismo, pacifismo, feminismo e movimentos estudantis como forças “recém liberadas” nos anos 60. Em suas palavras:

“A década de 1960 é, em vários aspectos, o principal período de transição; um período no qual a nova ordem internacional (neocolonialismo, a Revolução Verde, a disseminação dos computadores e das informações eletrônicas) é, ao mesmo tempo, instaurada e abalada, tanto por suas contradições internas quanto pela resistência externa.” 2

Ainda segundo análise de Jameson, as novas formas de “reações específicas contra as formas estabelecidas do alto modernismo”, abrangem diversas áreas culturais – literatura, cinema, artes plásticas, no caso da arquitetura é uma reação contra o Estilo Internacional, em suas palavras:

“(…) na década de 1960, surgiu da reação contra uma poesia modernista acadêmica, irônica e complexa; a reação contra a arquitetura moderna, em particular contra as construções monumentais do Internacional Style;(…) 3

Para compreensão daquela época, Jameson lança mais uma última peça naquele “quebra-cabeça” denominada “a morte do sujeito”, ou seja, o fim do individualismo, da identificação do estilo pessoal, particular e inconfundível, da estética modernista que segundo ele está “morta”. O mesmo ponto de vista é abordado por Stuart Hall, que analisa a década de 1960 como sendo o período de transformação do sujeito. Hall analisa que a partir da década de 1960, o sujeito sofre um processo denominado “descentramento”, cuja origem possui quatro origens. O primeiro “descentramento”, segundo Hall,  refere-se às tradições do pensamento marxista, e a influências de seus novos intérpretes de Marx a partir da década de 1960, como o filósofo Herbert Marcuse por exemplo.  O segundo descentramento refere-se ao descobrimento do inconsciente por Freud . O terceiro “descentramento”  refere-se a lingüística estrutural de Ferdinand Saussure, na qual a língua é um “sistema social e não individual”. Por último o quatro descentramento, que se refere aos movimentos contraculturais, que segundo ele é o grande marco da “modernidade tardia” . Ele destaca, ainda, o papel do feminismo neste processo, em suas palavras:

“(…) O feminismo faz parte daquele grupo de “novos movimentos sociais”, que emergiram durante os anos sessenta ( o grande marco da modernidade tardia) juntamente com as revoltas estudantis, os movimentos juvenis contraculturais e antibelicistas, as lutas pelos direitos civis, os movimentos pela paz e tudo aquilo que está associado com “1968”. O que é importante reter sobre esse momento histórico é que: -Esses movimentos se opunham tanto à política liberal capitalista do Ocidente quanto à política “estalinista” do Oriente.-eles afirmavam tanto as dimensões “subjetivas”quanto as dimensões “objetivas” da política.-eles suspeitavam de todas as formas burocráticas de organização e favoreciam a espontaneidade e os atos de vontade política.-como argumentado anteriormente, todos esses movimentos tinham uma ênfase e uma forma cultura fortes. Eles abraçaram o “teatro” da revolução.-Eles refletiam o enfraquecimento ou o fim da classe política e das organizações políticas de massa com ela associadas, bem como sua fragmentação em vários e separados movimentos sociais.-Cada movimento apelava para a identidade social de seus sustentadores. Assim, o feminismo apelava às mulheres, a política sexual aos gays e lésbicas, as lutas raciais aos negros, o movimento antibelicista aos pacifistas, e assim por diante. Isso constituiu o nascimento histórico do que veio a ser conhecido como a política de identidade uma identidade para cada movimento. 4

No contexto da arquitetura, a principal contribuição do movimento de Contracultura foi a liberdade de questionamento que abriu um novo caminho para analisar o Movimento Moderno, à medida que surge um sentimento “contramoderno”, também denominado, na época, também como “crise do modernismo”.

Este novo caminho de pensar a arquitetura foi definido pelo crítico norte americano Charles Jenks, quando publicou sua tese de doutoramento em 1973, com o título Modern Movementes in Architecture, um texto polêmico a favor do pluralismo e contra um Modernismo restrito. Segundo sua definição, a nova arquitetura que surgiu nos anos sessenta poderia ser definida como pós-moderna:

“[...]A arquitetura pós-moderna e neo-moderna (ou moderna recente) surgiu nos anos sessenta como reação ‘arquitetura moderna’ e a alguns dos seus falhanços mais notórios. Entre eles, um falhanço em gerar um desenvolvimento urbano convincente, um falhanço também em comunicar e efetivamente. Por isso, a arquitetura pós-moderna desenvolveu uma morfologia de base urbana conhecida como contextualismo, bem como uma linguagem arquitectónica mais rica baseada na metáfora, na imagística histórica e na imaginação.”

“Pós-modernistas são os arquitetos que evoluíram a partir dos movimentos anteriores porque se deram conta do caráter inadequado do Modernismo, como ideologia e também como linguagem. O modernismo não conseguiu transformar a sociedade numa direção positiva ou qualquer outra  (excepto em casos raros) e a principal linguagem, o Estilo Internacional, estava praticamente exausta nos anos sessenta, perdendo toda a sua riqueza [...] 5

Fredric Jameson opina sobre a afirmação de Charles Jenks sobre o surgimento da arquitetura nova, pós-moderna e que esta se distingue da anterior, do alto modernismo, sua prioridades populistas, em suas palavras:

“No que tange ao surgimento do novo, contudo, a afirmação de Jenks de que a arquitetura pós-moderna se ditingue daquela do alto modernismo por suas prioridades populistas poder servir de ponto de partida para uma discução um pouco mais geral. O que é indicado, no contexto especificamente arquitetônicos, é que, equanto o espaço, agora mais clássico, do alto modernismo de um Corbusier ou de Wright tentava diferenciar-se radicalmente da decadente malha urbana no que ele surgia –sendo as suas formas, portanto, dependentes de um ato de disjunção radical de seu contexto espacial(drástica separação do chão pelo grande pilotis, salvaguardando o Novum do novo espaço)-, a construção pós-modernista, ao contrário celebra a sua inserção na malha heterogênea da área comercial e da paisagem de motéis e fast-food da cidade americana pós-vias expressas.(…) 6

Outra influência marcante do período foi o avanço tecnológico que representou a conquista espacial. Josep Maria Montaner afirma que esta influência está presente nas novas tendências arquitetônicas que surgem dos países industrialmente mais avançados, como Grã-bretanha, Alemanha, Estados Unidos e Japão, nos anos de 1960.

Um exemplo dessa afirmação de Montanher é atuação do Archigram, um grupo que surge no meio estudantil britânico com propostas arquitetônicas radicais. O Archigram liderado pelo arquiteto Peter Cook, publicou suas idéias, pela primeira vez, na revista homônima, Achigram, de 1961. O grupo que tinha como membros os arquitetos Dennis Crompton, Warren Chalk, David Greene, Ron Herron, Cedric Price e Michael Webb, seguia a linha de pensamento do norte americano Richard Buckminster Füller , segundo análise de Montaner:

“Las propuestas de Archigram constituyen uma curiosa sintesis entre la cultura del ‘pop’ inglês y la assimilación optimista de los progresos tecnológicos; una irónica alianza entre las técnicas comunicaciionales y las utopias tecnocráticas. Pero al mismo tiempo significan la continuidade de propuestas radicales de innovación tecnológica como planteada desde finales de los años veinte por Richard Buckminster Fuller (1895-1983)”. 7

Ainda segundo análise de Montaner, os projetos teóricos do Archigram, podem ser considerados como “metáforas visuais” . Propostas como o Centro do Pecado, de Michael Webb, de 1962; Plug-in City, de Peter Cook, de 1964;  Walking Cities, de Ron Herron, de 1964 e  Potteries Thinkbelt, de Cedric Price, 1966 são conhecidos mundialmente, nos anos de 1963 a 1965.

Os projetos do Archigram eram criativos, porém descompromissados com a realidade, não havia a preocupação, por exemplo, com as consequências ecológicas ou sociais de suas proposições e sua possível realização, segundo análise de Kenneth Frampton:

“[...] O compromisso subsequente do Archigram com uma abordagem infraestrutural, leve e high-tech (o tipo de indeterminação implícita na obra de Fuller e ainda mais evidente em L’Architecture mobile [a Arquitetura móvel] de Yona Friedman, 1958) levou o grupo, de modo um tanto paradoxal, a entregar-se a formas irônicas de ficção científica, em vez de projetar soluções que fossem ou realmente indeterminadas, ou passíveis de serem realizadas e apropriadas pela sociedade.”

[...] o Archigram não via motivo para preocupar-se com as consequências sociais e ecológicas de suas diversas propostas megaestruturas, das quais a Plug-in City de Peter Cook (1964) foi um exemplo típico. Da mesma maneira, em sua obsessão pelas cápsulas suspensas da era espacial, Dennis Crompton, Michael Webb, Warren Chalk e David Greene são se sentiam obrigados a explicar por que alguém optaria por viver num dispositivo mecânico tão caro e sofisticado, enfrentando, ao mesmo tempo, uma existência num espaço tão brutalmente exíguo.” 8

Contemporâneo ao Archigram, o grupo holandês Provo lançou propostas curiosas para a arquitetura e o urbanismo.  O Provo, cujo nome deriva de uma holandesa para provocação, foi formado por jovens de influência anarquista e contracultural, que se autodefiniram como:

“PROVO é alguma coisa contra o capitalismo, o comunismo, o fascismo, a burguesia, o militarismo, o profissionalismo, o dogmatismo e o autoritarismo.” 9

O Provo realizou diversas manifestações públicas – happenings, a fim de buscar o equilíbrio entre o místico, o artístico e a contestação política. Com humor e deboche suas manifestações imobilizaram as autoridades holandesas, que não sabendo como lidar com os jovens, partiram para a repressão violenta e sistemática.  Em resposta a repressão policial, o grupo atuou de forma pacífica e bem-humorada, lançando manifestos denominados “Planos”.

O primeiro deles, que se tornou símbolo do grupo, foi o “Plano bicicletas brancas” cuja ideia era espalhar, pela cidade de Amsterdam, bicicletas pintadas de branco, que teriam uso comunitário e gratuito.  A polícia recolheu todas as bicicletas e foi acusada pelo grupo de furto.  O “Plano bicicletas brancas” foi um manifesto contra as “caixas de ostentação de status” (automóvel), que produziam poluição e acidentes fatais, o Provo defendia que o centro de Amsterdam fosse fechado definitivamente ao tráfego de veículos.

Para o Provo, o termo “branco” adquiriu uma conotação de pureza e ação contra a poluição e outros problemas urbanos. Assim, o termo branco foi utilizado para todos os planos subsequentes, a saber: “Plano chaminés Brancas”, um manifesto contra a poluição da cidade, “Plano Mulheres Brancas” de cunho feminista e o “Plano Moradias Brancas”, do arquiteto Hans Niemeyer, que seria um “freio à especulação imobiliária”, cujo objetivo seria a revitalização do centro histórico de Amsterdam  a partir da  mudança de uso dos prédios de escritórios para sua “função original de habitação”,  pois desse modo evitaria o despovoamento do centro.

Outro arquiteto, Constant, que pertenceu ao grupo dos Situacionistas, publicou seu artigo New Urbanism, na revista Provos número 9, de 1966, com uma dura crítica as cidades modernas:

 Já é visível uma crescente discrepância entre os padrões aplicados nas distribuições dos espaços urbanos e as reais necessidades da comunidade. Projetistas e arquitetos ainda tendem a pensar nos mesmos moldes estabelecidos por Le Corbusier em 1933, quando falava das quatro funções da cidade: viver,trabalhar, transitar e lazer. Essa excessiva simplificação reflete mais uma forma de oportunismo do que a capacidade de observação e de apreciação daquilo que as pessoas desejam hoje, resultando em que a cidade está se tornando rapidamente um conceito obsoleto. Numa época em que a automação e outros progressos tecnológicos estão reduzindo a demanda de trabalho manual continua-se programando bairros operários cuja única função é a de dormitórios.

Enquanto o número de automóveis particulares estão se multiplicando em um ritmo tão frenético a ponto de torná-los praticamente inúteis para o deslocamento, continua-se subtraindo espaço vital em prol de áreas de estacionamento de automóveis.” 10

As propostas do grupo Provo foram inovadoras para época e, ao que parece, precursoras das primeiras manifestações de cunho ecológico, urbanístico e arquitetônico, em todas elas estão presentes o questionamento do status quo.  Um dos expoentes do movimento Maio de 68, na França, Cohn Bendit, disse que a atuação do grupo foi importante para a conscientização e formação da opinião pública daquela época:

“Ainda que os ideais defendidos pelos Provos e kabouters tenham modificado muita coisa no cotidiano dos holandeses contribuído para o surgimento de uma consciência ecológica, feminista, para uma abordagem dos problemas sexuais, para um interesse real pelos problemas de urbanização eles nunca chegaram a ameaçar o sistema político e econômico reinante.” 11

Poucos objetivos foram alcançados pelo grupo Provo, que se dissolveu em 1967. Suas ideias, porém, frutificaram, pois, trouxeram soluções para problemas reais e concretos, neste ponto elas se diferem das propostas do grupo britânico Archigram. O “Plano Bicicletas Brancas”, por exemplo, foi uma boa idéia que acabou sendo adotada, nos dias atuais, na França.

Os reflexos da contracultura estão presentes nos dias de hoje, quer seja no estilo de vida “alternativo” adotado por muitas pessoas, quer seja nos ideários do ecologismo, na arquitetura denominada “pós-moderna” que questionava o status quo do Estilo Internacional ou ainda na arquitetura “verde” – um novo campo de atuação para arquitetos.

NOTAS:

1 HARVEY, David Condição pós-moderna: Uma pesquisa sobre as origens da mudança cultural. São Paulo, Edições Loyola, 1992.p.44.
2 JAMENSON, Frederic.  Pós-modernismo e sociedade de consumo. In A virada Cultural reflexões sobre o pós-moderno, Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 2006.p. 20.
3 JAMENSON, Frederic.  Pós-modernismo e sociedade de consumo. In A virada Cultural reflexões sobre o pós-moderno, Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 2006.p. 17
4 HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade; Tradução Tomaz T.da Silva, Guacira L. Louro – 10 ed. – Rio de Janeiro: DP&A, 2005. (primeira edição 1992), p.41.
5 JENCKS, Charles.Movimentos Modernos em Arquitetura. São Paulo: Martins Fontes, 1985.
6 JAMENSON, Frederic.  Pós-modernismo e sociedade de consumo. In A virada Cultural reflexões sobre o pós-moderno, Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 2006.p. 60
7 MONTANER, Josep Maria. Después del movimiento moderno arquitectura de la segunda mitad del siglo XX. Barcelona: Gustavo Gili, 1993, p. 113.
8 FRAMPTON, Kenneth. História Crítica da Arquitetura Moderna. São Paulo: Martins Fontes, 1997, p.342.
9 GUARNACCIA, MATEO. Provos : Amsterdam e o nascimento da contracultura, trad. de Leila de Souza Mendes:São Paulo: Conrad Editora do Brasil, 2001.
10 Ibidem, p. 15.
11 Ibidem, p. 75.
 
    Edite Galote Carranza
    é mestre pelo Instituto Presbiteriano Mackenzie em 2004; doutora pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP em 2013 com a tese “Arquitetura Alternativa: 1956-1979”; foi diretora do escritório de arquitetura e editora G&C Arquitectônica Ltda, editora-chefe da revista eletrônica 5% arquitetura + arte ISSN 1808-1142. Publicações em revistas especializadas, livros Escalas de Representação em Arquitetura, Detalhes Construtivos de Arquitetura e O quartinho invisível: escovando a história da arquitetura paulista a contrapelo. foi Professora da graduação e pós-graduação em arquitetura e urbanismo.

    Arquitetura, contracultura e sustentabilidade: Parte 1

    Categoria: Sustentabilidade Escrito por Edite Galote Carranza

     

     

     EDITE GALOTE CARRANZA

     

    PARTE1 – CONTRACULTURA E ECOLOGISMO

    A CONTRACULTURA foi um movimento social que surgiu e tomou corpo em um período histórico conturbado. Foram tempos marcados pela Guerra-fria - conflito que dividiu o mundo em dois blocos: de um lado o EUA capitalista e de outro a URSS socialista, e que teve como consequências a corrida armamentista nuclear, a conquista espacial e a Guerra do Vietnã.

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    Arquitetura, contracultura e sustentabilidade: Parte 2

    Categoria: Sustentabilidade Escrito por Edite Galote Carranza

    Contracultura, composição: Fonte. Edite Galote Carranza

    EDITE GALOTE CARRANZA

    PARTE 2: ECOLOGISMO E O “SUJEITO ECOLÓGICO”

    Ecologia – a ciência da casa, é um termo cunhado pelo biólogo alemão Ernest Haeckel, em 1886, para definir a nova disciplina científica que trata das relações entre as espécies animais e o seu ambiente orgânico e inorgânico. A partir de sua vertente biológica original, esta ciência ganhou contornos multidisciplinares, designando um amplo campo de atividades cujo ponto em comum é o “pensamento ecológico”.

    O pensamento ecológico possui, ao menos, quatro segmentos distintos a saber: a Ecologia Natural estuda os sistemas naturais e a dinâmica da natureza, a Ecologia Social estuda a relação entre os homens e o meio ambiente em especial a ação humana e suas consequências no ambiente natural, o Conservacionismo engloba o conjunto de ideias e estratégias em prol a preservação dos recursos naturais e, por último, o Ecologismo, que empreende a construção de um projeto político de “transformação social” cujo ideal busca a sociedade não opressiva e comunitária (LAGO – PÁDUA, 1984).

    A década de 1960 foi especialmente importante para o “pensamento ecológico”, pois marca a ampliação dos debates que saem do âmbito acadêmico e atingem a opinião pública. Neste sentido, foi de grande importância à publicação, em 1962, do livro Silent Spring (Primavera Silenciosa), da bióloga Rachel Carson. Escrito em linguagem clara e acessível, o livro aborda a questão da degradação do meio ambiente, em especial, pelo uso de pesticidas como o DDT. A principal contribuição do livro foi o aumento da consciência pública em relação às consequências das atividades humanas no meio ambiente. Silent Spring é considerado, por muitos autores, como a obra inaugural da literatura ambientalista.  Contudo, uma das contribuições mais importantes para a formação do “pensamento ecológico” foi o ideário contracultural.

    O ideário contracultural trouxe o questionamento e protesto a cerca das questões mais importantes da década de 60. Os jovens foram às ruas, em manifestações contra a Guerra do Vietnã, contra a corrida armamentista e os testes nucleares, e, em favor dos direitos sociais das mulheres e negros. Muitos agentes contribuíram para a formação desse ideário como por exemplo: na linha do pacifismo e não violência o poeta americano Henrry David Thoureau e o líder do movimento negro pastor Martin Kuther King; na linha de pensadores liberais e humanistas Lewis Munford; na linha de pensadores marxistas Herbert Marcuse; além dos escritores “rebeldes” da geração beat  (LAGO – PÁDUA, 1984).

    Assim, podemos concluir que o Ecologismo nasce no contexto do movimento de Contracultura como um segmento de atuação política na área ambiental. Segundo afirma a educadora Isabel Cristina e Moura Carvalho, em suas palavras:

    “Dessa forma, discutir o ecologismo sem situá-lo em relação à sua filiação contracultural e romântica seria reduzir a compreensão daquilo que fundamentalmente o inspira e lhe confere o clima e o tom predominante. É nesse ambiente que a crítica ecológica ao progresso e ao capitalismo industrial nas décadas de 1960 e 1970 integra um espectro amplo e complexo de contravalores que se caracteriza pelo questionamento do status quo das sociedades desenvolvidas, pela crítica aos valores da modernidade ocidental e pela busca de um novo mote de organizar a vida individual e coletiva. No ecologismo, a visão da natureza como contraponto da via urbana, tecnocrática e industrial aparece combinada com o sentimento anti-social da contestação romântica. Traços centrais do repúdio romântico à uniformidade da razão, ao seu caráter instrumental, ao individualismo racionalista e à lógica do mercado podem ser observados em certas inspirações do ideal societário ecológico que se afirmar como via alternativa contraria os ideais de progresso e de desenvolvimento da sociedade capitalista de consumo.’ (01)

    O mote do Ecologismo, enquanto projeto político de transformação social, cultural e econômica da sociedade, é uma vida alternativa à sociedade industrial tecnocrática, objetivando um melhor relacionamento com a natureza.  O Ecologismo é formado por um amplo espectro de ativistas – cientistas, amantes da natureza, representantes socialistas, pacifistas, ex-hippies etc (02). Neste conjunto encontramos o beat Gare Snyder – ativista até os dias atuais, criou o conceito “deep ecologism” ou ecologismo a fundo e Daniel Cohn-Benedit, líder do movimento do maio de 68, que anos mais tarde se tornou diretor de um jornal ecológico, militante do partido Verde alemão e copresidente do grupo Verde do Parlamento Europeu.

    Os primeiros resultados práticos obtidos pelo Ecologismo foram a primeira Conferência da Biosfera Biosfera (03), realizada pela UNESCO, em Paris, em 1968, que pôs em discussão os impactos das atividades humanas sobre o planeta e a Conferência das Nações Unidas sobre o ambiente humano, realizada em 1972, na cidade de Estocolmo.  Essas conferências discutiram, pela primeira vez, questões políticas, sociais, e econômicas geradoras dos impactos no meio ambiente. A Conferência de 1972 teve grande impacto na opinião pública daquela época, devido a publicação do relatório do grupo conservacionista, Limites do Crescimento (The Limits to Growth”) elaborada por cientistas do Massachusetts Institute od Techbology (MIT) .

    Segundo José Augusto Pádua, a partir dos anos de 1980, cresce um novo movimento intermediário entre o Ecologismo e o Conservacionismo, que adquire contornos mais definidos em relação às áreas de concentração e atuação, o Ambientalismo, em suas palavras:

    “de 1980 para cá, sinto que o que cresceu não foi nem o conservacionismo nem o ecologismo. Cresceu algo intermediário, que chamamos ambientalismo no sentido mais profundo e acurado da palavra: fortaleceu-se a idéia de que o conservacionismo não basta, pois são necessárias mudanças econômicas e sociais, menos racicais, porém do que os ecologistas pregaram “ (04)

    O amplo espectro de atores que direta ou indiretamente estão envolvidas com as questões ambientais, como educadores, ativistas ou mesmo “simpatizantes”, podem ser classificados como “sujeitos ecológicos”, que apesar das diferenças de foco e posturas tem em comum o “ethos contracultural” conforme análise de Isabel Carvalho, em suas palavras:

    {…} Ao ter como base da análise o entrecruzamento das trajetórias de vida e da tradição ambiental, adoto o ethos contracultural como parte da atualização contemporânea de um horizonte ambiental. Nesse, a contracultura aparece como matriz simbólica de grande recorrência na formação de um tipo ideal que descrevo aqui, como sujeito ecológico.” (05)

    A ampla atuação dos “sujeitos ecológicos” adquire, no decorrer do tempo, maior especificidade, desde a formação dos Partidos Verdes – que levam para o âmbito das políticas públicas questões fundamentais voltadas a melhoria da relação homem x meio ambiente, até a atuação de organizações não governamentais ou independentes, como o Greenpeace (06), cuja atuação “não-violenta e criativa”, procura incentivar a mudança de atitude – de sujeitos, empresas ou governos, em prol à defesa do meio ambiente.

    Na arquitetura e urbanismo, também é possível constatar os reflexos da atuação dos “sujeitos ecológicos”. A partir da década de 1960, surgem novas tendências arquitetônicas alternativas ou ecológicas e, outras que valorizam ao máximo as possibilidades tecnológicas. Tendências que, segundo Josep Maria Montanher, surgem nos países mais avançados como Grã Bretanha, Alemanha, Estados Unidos e Japão, uma situação de grande diversidade em oposição à unidade do estilo internacional, em suas palavras:

    “[...] Si en los años cuarenta y cinuenta aún predominaba la continuidad y revisión de una tradición única – la del Movimiento Moderno – a partir de los años sesenta se asiste a uma situación de grande diversidad de posiciones.[...] eclosionan las propuestas hipertecnológicas de aquellos que quieren llevar hasta las últimas consecuencias las sugerencias de las vanguardias. Pero al mismo tiempo, mientras se desarrollan estas propuestas de alta tecnologia surgen ya voces en favor de una arquitectura alternativa y ecológica.” (07)

    O Ecologismo tornou-se, portanto, um incentivo aos avanços plástico-conceituais na arquitetura contemporânea. Projetos como os de Foster and Partners, Michael Hopkins and Partners e Kenneth Yeang,  entre muitos outros, tem como mote soluções plásticas inovadoras em harmonia com as técnicas, visando edifícios sustentáveis.

    Nota: Este artigo continuará nos próximos números.

    [1] CARVALHO, Isabel Cristina e Moura. A invenção ecológica:narrativas da educação ambiental no Brasil.-2ed.-Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2002.P.57.

    [2] (LAGO E PÁDUA, 1985, P. 10)

    [3] Conferência Intergovernamentas de Especialistas sobre as Bases científicas para o Udo econservação Racionais dos Rescursos da Biosfera. Em pauta questões reacionadas a conservação da biosfera e pesquisas em Ecologia. Colaboraram, também, a Organização para Alimentação e Agricultura da União Internacional para a conservação da Natureza e dos Recursos Naturais ( UICN) e do conselho Internacional das Uniões Científicas.

    [4] PADUA, José Augusto.  IN ISABEL CRISTINA P. 17

    [5] CARVALHO, Isabel Cristina e Moura. A invenção ecológica: narrativas da educação ambiental no Brasil.-2ed.-Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2002.P.94.

    [6] Fundado em 1971 no Canadá.

    [7] MONTANER, Josep Maria. Después del movimiento moderno arquitectura de la segunda mitad del siglo XX. Barcelona: Gustavo Gili, 1993, p. 111.

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    PAES, Maria Helena Simões. A década de 60: São Paulo, Editora Ática, 1997.
    PEÇANHA, Doris Lieth Nunes.Movimento Beat: abordagem literária, sócio-histórica e psicanalítica: Petrópolis, Vozes, 1988.
    PEREIRA, Carlos Alberto M. O que é contracultura: São Paulo, Brasiliense, 1986.
    PRAIANO, Enor. Tropicalismo bananas ao vendo no coração do Brasil:São Paulo, Editora Scipione, 1996.
    ROSZAK, Theodore. A contracultura.Rio de Janeiro: Editora Vozes, 1972.
    VENTURA, Zuenir. 1968: O ano que não terminou: Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1988.
    VENTURA, Zuenir. Minhas histórias dos outros: Rio de Janeiro, Editora Planeta Brasil, 2005.
    VALADARES, Eduardo; BERBEL, Márcia. Revoluções do século XX:São Paulo, Editora Scipione, 1994
    Curso de gestão ambiental/ Arlindo Philippi Jr, Marcelo de Andrade Romero, Gilda Collet Bruna, editores – Barueri, SP: Manole, 2004.

     

      Edite Galote Carranza
      é mestre pelo Instituto Presbiteriano Mackenzie em 2004; doutora pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP em 2013 com a tese “Arquitetura Alternativa: 1956-1979”; foi diretora do escritório de arquitetura e editora G&C Arquitectônica Ltda, editora-chefe da revista eletrônica 5% arquitetura + arte ISSN 1808-1142. Publicações em revistas especializadas, livros Escalas de Representação em Arquitetura, Detalhes Construtivos de Arquitetura e O quartinho invisível: escovando a história da arquitetura paulista a contrapelo. foi Professora da graduação e pós-graduação em arquitetura e urbanismo.
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      A casa com cheiro de floresta

      Categoria: Sustentabilidade Escrito por Edite Galote Carranza

      Casa de Tomaz Lotufo, fachada frontal. Fonte: Tomaz Lotufo

      EDITE GALOTE CARRANZA  

       “Na fábula, o beija flor leva no bico
      a gota que salvará a floresta do incêndio.
      Sensibilizados por tamanha bravura, os demais
      animais se unem e vencem as chamas.”[1]

      Tomaz Amaral Lotufo leva com desenvoltura o bastão arquitetônico familiar. Formado pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Pontifícia Universidade Católica de Campinas (2000), ele representa a terceira geração de uma família de arquitetos: o avô Zenon Lotufo[2]

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