A arquitetura e as técnicas construtivas em bambu: Aplicação no Centro Cultural Max Feffer

Categoria: Ciências sociais aplicadas: Arquitetura

VANESSA CAROLINA DE SOUZA

CÉLIA REGINA MORETTI MEIRELLES

PAULA MENDES THOMAZ RIMI

Resumo:

Crescentemente profissionais da área da construção vêm buscando materiais naturais e sustentáveis no momento de projetar e construir suas obras, por esta razão a pesquisa busca analisar as principais contribuições, características e estratégias construtivas do bambu, numa obra específica - Um material natural e abundante na natureza, com excelentes propriedades físicas, mecânicas e de fácil manuseio e cultivo. O artigo investiga a obra projetada pela arquiteta Leiko Motomura, uma das pioneiras no uso de materiais alternativos e sustentáveis no Brasil, dada a sua relevância em projetos com o uso deste material, destacando a aplicação do bambu como um material sustentável.

A pesquisa escolheu como estudo de caso a obra “Centro Cultural Max Feffer”, dada a sua valorização e o resgate das técnicas construtivas. A pesquisa estabelece a importância da utilização de um material alternativo na arquitetura contemporânea numa lógica construtiva e sustentável onde o processo do projeto avalia as condições do local, a cultura vernacular, a cultura tectônica e o meio ambiente.

Introdução

O impacto do modo de produção na sociedade sobre o meio ambiente é abordado por diferentes pesquisadores. Entre estes, destacam-se as publicações, "Primavera Silenciosa" de Rachel Carson em 1962, e “Os limites do crescimento” de Donella H. Meadows, Dennis L. Meadows, Jørgen Randers e William W. Behrens em 1972 encabeçado pelos cientistas do Clube de Roma.  Neste último os autores argumentavam a preocupação com o esgotamento dos recursos do planeta em aproximadamente 100 anos, devido à problemas como, padrão de crescimento da população, o modo de produção de alimentos e seus contaminantes, o modo de produção industrial e o alto grau de poluição. (OLIVEIRA, 2012)

Para suprir as metas estabelecidas pelo Clube de Roma, a ONU em 1988 define o “Desenvolvimento Sustentável” no documento   conhecido como Relatório Brundtland, de modo a preservar os recursos naturais conceituando-o como o “aquele que atende as necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem suas próprias necessidades” (ONUBR, 1987).

Balleste (2017), afirma que, 

[...]a maioria dos recursos tanto materiais como energéticos utilizados pela humanidade provém de fontes finitas, porém, a lógica atual do sistema socioeconômico global (capitalismo) é a do crescimento infinito. Essa contradição sistêmica entre o modelo produtivo teórico e as restrições da exploração dos recursos na prática supõe que tem que ser corrigida em todos os âmbitos da sociedade 

(BALLESTE, 2017, p. 20). 

Devido ao alto consumo de recursos naturais e energia primária, bem como a grande quantidade de resíduos que o setor da construção civil produz um grande impacto no meio ambiente. Neste contexto a construção de edifícios, impacta desde a extração, e a produção de materiais, a construção, a operação e manutenção, desmontagem e reuso. Schiller (2003) destaca que "75% dos recursos naturais" mundiais são consumidos por meio dos negócios da construção civil, chegando a gerar cerca de "500 kg por habitante por ano". Neste contexto, cerca de "50% do consumo de energia” é absorvido por edifícios em funcionamento, e “21% do consumo de água".

Para Schiller (2003) “a edificação sustentável promove diversos benefícios que se estendem além de sua participação no melhoramento das condições ambientais e mitigação do impacto ambiental, uma vez que representam o estabelecimento de uma nova ordem de princípios básicos de desenho em todas as suas escalas. Tais princípios se fundamentam em sistemas e ciclos naturais, maior dependência de recursos locais, particularmente para a geração, distribuição e uso de energia e água, com dimensão social e projeção ao futuro” (SCHILLER, 2003, p.13). 

Segundo Vélez (2000), a sustentabilidade na arquitetura necessita englobar todo o processo: desde a fase de projeto, execução da obra, o uso do edifício e na fase de demolição. Sempre de forma a valorizar os parâmetros relevantes na arquitetura, como o entorno, o edifício e o seu funcionamento, os materiais utilizados e finalmente e não menos importantes os aspectos socioculturais. 

De acordo com Balleste (2017), o bambu vem ganhando notoriedade no meio arquitetônico por ter características que ampliam os índices de sustentabilidade em edificações, em especial por ser um material renovável e de crescimento rápido e que incorpora o CO2. Apesar de ser um material pouco reconhecido e aplicado no Brasil, é utilizado há muitos séculos por comunidades rurais e indígenas. O bambu é um material acessível e está presente na maior parte do planeta há milhares de anos; contudo, a escassa literatura e a falta de pesquisa acerca de suas aplicações, se comparado aos materiais convencionais, diminui o entendimento dos profissionais da área sobre o comportamento do material. Sua composição faz com que seja considerado um material de características mecânicas extraordinárias, portanto extremamente apto a ser utilizado em construção. Sua capacidade de resistir a esforços de tração e compressão, faz deste um material potencial, concorrente dos convencionais. 

É possível supor que as primeiras coberturas, concebidas como abrigo para se proteger de adversidades climáticas, foram idealizadas e construídas com materiais leves como o bambu e a madeira. Este fato em conjunto com sua ótima resistencia a tração paralelo a fibra leva Frei Otto a estudar e a financiar a sua aplicação nas coberturas tencionadas no Instituto das estruturas leves de Stuttgart, promovendo as pesquisas de Klaus Dunkelberg (1992).

O objetivo geral deste artigo é analisar a aplicação do bambu na arquitetura por meio de um estudo de caso reconhecido. Portanto, analisa o projeto, a técnica construtiva e sua aplicação.

Como método, o artigo será divido em duas partes: na primeira destaca-se o referencial teórico com aplicação do bambu em colmos na arquitetura.

Na segunda parte analisa-se o estudo de caso: a obra de Leiko Hama Motomura em Pardinho. Nesta etapa será analisado o projeto de arquitetura e as técnicas construtivas aplicadas a montagem da estrutura.

Referencial teórico

Sistemas construtivos e a cultura tectônica

Tectônico é um termo grego que se origina da palavra tekton, que significa carpinteiro ou construtor. A tectônica trás a união entre a confecção artística e a construção artesanal (FRAMPTON,1995). A arquitetura se desenvolve juntamente com as artes, uma vez que trabalham em colaboração quando se trata de projetar um ambiente construído, de acordo com Schwart (2017), “A arquitetura é uma arte interativa, que combina o design do espaço produtivo com as realidades tangíveis da gravidade, propriedades materiais e sequencias de montagem, entre outras. Para que a arquitetura tenha sucesso, ela deve ser pensada como um todo.”. A tectônica faz a junção destes elementos como: espaço e objeto construído, estrutura e organização dos espaços e a relação entre a atmosfera e a funcionalidade do local, a tectônica se preocupa em estabelecer uma ligação entre o desenho projetado do espaço e a realidade da matéria construída. (SCHWART, 2017)

A teoria tectônica é uma parte da arquitetura que estuda e investiga de onde aflora os mecanismos utilizados para o desenvolvimento de projetos e construções utilizados por arquitetos, ela articula a ligação que se forma entre o design do objeto, a edificação e espaço durante a elaboração de um projeto arquitetônico ou simplesmente a experiência aplicada ao local. A tectônica compreende não apenas o que foi realizado no passado, mas também o que será realizado no futuro, como por exemplo a compreensão e entendimento sobre a relação entre forma e estrutura utilizada nas obras arquitetônicas, de que modo o seu interior permanece ligado a obra e ao visitante.

Uma construção vista, aos olhos da tectônica, não vem a ser um mero objeto, mas sim como um processo de experimentação e fabricação, afirma Pallasmaa (2005): "A autenticidade da experiência arquitetônica está alicerçada na linguagem tectônica da construção e na compreensibilidade do ato de construir para os sentidos.", isto demostra que os seres humanos vivenciam suas experiências de mundo através dos cinco sentidos como visão, olfato, paladar, audição e tato, assim podemos sentir o físico e material unidos ao corpo, um dos papeis do arquiteto.(SCHWART, 2017)

De acordo com o crítico de arquitetura Frampton (1995), vivenciar o meio ambiente vem a ser importante uma vez que o corpo humano reconstrói o mundo por meio de sua apropriação tátil da realidade. As primeiras sociedades se desenvolveram a partir da experiência com a natureza.

Schwarzer (1993), estuda sobre a teoria da tectônica do arqueólogo alemão Karl Bötticher desenvolvida na década de 1840. Bötticher considerou que a tectônica arquitetônica remete as atividades construtivas de um edifício, ele explorava a arquitetura por meio das técnicas construtivas e incorporação de estudos sobre a função, estrutura e simbolismo. Os arquitetos projetam edifícios com base em uma matéria não estabelecida, e sim em uma ordem natural e cultural.

Bambu na arquitetura

Materiais naturais e mais sustentáveis vêm sendo cada vez mais explorados não apenas por profissionais da área da construção, mas também expostos em grandes eventos e conferências mundiais organizadas pela Nações Unidas. Tal como a Agenda 21 realizada no Rio de Janeiro em 1992, como a mais importante conferência a apresentar abordagens futuras em prol do meio ambiente, ou a conferência de Estocolmo em 1972 que inseriu a palavra “eco-desenvolvimento” e que mais tarde viria a ser o que atualmente usamos como desenvolvimento sustentável. (VON VEGESACK; KRIES, 2000)

O Brasil por meio do Congresso nacional no ano de 2011 criou a Lei n.º 12.484/2011, que institui a Política Nacional do Incentivo ao Manejo Sustentado e ao Cultivo do Bambu (PNMCB), como mais um mecanismo de auxiliar o futuro do planeta.

É considerado um material de excelente qualidade devido suas características estruturais. A relação resistência / peso é mais vantajosa do que da madeira e ele admite maior flexão do que a maioria dos materiais. O bambu pode ser a matéria-prima de todas as partes de uma casa, inclusive, nos projetos populares, ficando até́ 50% mais baratam do que as convencionais. É uma casa que traz diversos benefícios ambientais, agregando alto valor tecnológico e em relação às construções populares construídas hoje em dia apresenta um padrão de qualidade bem superior. (RIBAS, 2016, pág.9)

De acordo com Maia (2012), atualmente na construção civil são utilizados muitos materiais industrializados que produzem uma enorme quantidade de entulhos que muitas vezes acabam sendo descartados no meio ambiente. Deste modo pesquisa-se o uso de materiais não convencionais para a diminuição dos impactos ambientais. O bambu surge como uma matéria prima sustentável e por ser um material que possui inúmeras aplicabilidades na constrição civil como em paredes, forros, pisos, mobiliários e diversos utensílios, ajuda com a diminuição dos efeitos causados pelo aquecimento global absorvendo uma grande quantidade de CO2 da atmosfera.

O bambu protege o solo, sequestra carbono rapidamente e pode ser utilizado junto com outras madeiras, em reflorestamentos, sendo capaz de fornecer alimento e matéria-prima de boa qualidade, podendo contribuir para evitar o corte cada vez mais acentuado das árvores e das florestas tropicais. (PEREIRA; BERALDO, 2007, pág.35).

O estudo da arquitetura vernacular tem sido deixado de lado ao longo dos anos por não possuir tantos recursos tecnológicos como os atuais materiais utilizados no mercado da construção civil, o que implica de acordo com Espinha; Sant’Anna (2013), o não reconhecimento destas técnicas primitivas como sendo arquitetura para alguns profissionais. Por essa razão incorre-se na gradativa perda e esquecimento da história e das culturas de comunidades mais tradicionais, onde a introdução do uso de materiais como o concreto se torna cada vez maior por passar uma mensagem de status social, uma vez que os materiais naturais como a madeira e o bambu se tornam aparentemente obsoletos e símbolo de menor desenvolvimento e pobreza.

 Torna-se, portanto, importante o resgate das técnicas vernaculares na arquitetura. Segundo Ballesté (2017), o projeto da arquiteta Leiko Motomura faz parte do programa “Projeto Pardinho”, cidade onde há um incentivo das políticas de desenvolvimento sustentável no campo ecológico e sociocultural.

Segundo Feffer (2011), o projeto do Centro Cultural levou aproximadamente dois anos para ser desenvolvido, pois a comunidade foi convidada a participar do processo de projeto, podendo apresentar sugestões e necessidades para o novo espaço, criando uma harmonia entre o projeto e a comunidade. Essas atividades se conectam com a tectônica, uma vez que se pode explorar os materiais e a função do projeto de acordo com os desejos apresentados pela comunidade local.

Um novo olhar pode trazer novas característica para os projetos de arquitetura, onde cada vez mais se tem a preocupação com as questões de sustentabilidade. Além de ser um material presente em quase todo o mundo, é de fácil cultivo, fácil manuseio, suas fibras possuem uma ótima resistência quando utilizadas estruturalmente em construções, e, diante deste quadro, pergunta-se:  por que, não se beneficiar desta matéria prima abundante e renovável na construção civil?

Estudo de Caso - Centro Cultural Pardinho

O “Centro de Cultura Max Feffer”, projetado pela arquiteta paulistana Leiko Motomura, em conjunto com o Instituto Jatobás, está localizado na cidade de Pardinho, São Paulo, teve seu início em 2008 e foi concluído em 2009. Com uma área de 7.130 m², o Centro de Cultura foi planejado com a finalidade de promover a cultura e os princípios de sustentabilidade na região, através da utilização de sistemas e materiais com o menor impacto ambiental. O centro conta com diversas atividades que permite a integração dos moradores por meio de inclusão digital, atividades artísticas, espetáculos, entre outros. (VICTORIANO, 2008)

Figura 01 - Centro Cultural Max Feffer. Fonte: Das autoras. Figura 01 - Centro Cultural Max Feffer. Fonte: Das autoras.

No local já havia uma pequena estrutura existente para apoio do palco e um conjunto de sanitários faziam parte que foi cedido pela prefeitura para a construção do Centro Max Feffer, onde se localizava uma antiga praça. O atual edifício ocupa "15%" do terreno e é dividido em duas áreas de atividades, a primeira possui uma área construída de 830 m². Na parte térrea, estão alocados os ambientes para leitura, área multiuso, salas de reuniões, depósito e os sanitários. O andar superior tem área total de 740 m ², sendo um espaço coberto que apresenta a função de uma praça, uma sala de exposição fechada e um palco. (VICTORIANO, 2008)

A cobertura de duas águas apresenta como seu elemento principal construtivo o bambu em colmos conectados por pinos álicos, uma vez que distribui suas cargas nas vigas e pilares duplos de madeira maciça de eucalipto a cada nove metros de distância. A madeira roliça abrange Guadua chacoensis foi a espécie de bambu utilizado para a montagem da cobertura, com cerca de10 cm de diâmetro aproximadamente e 1.048 colmos que se apoiam sobre vigas cilíndricas de madeira eucalipto com 30 cm de diâmetro, cada viga suporta a carga de 260 colmos de bambu diagonais com a formação de um desenho em V. A totalidade da estrutura de cobertura é apoiada em 24 colunas distribuídas a cada 9 metros de distância. (BALLESTE, 2017)

Figura 2 - Desenho de uma fração da cobertura do Centro Cultural Max Feffer, Fonte: Das autoras com base nas imagens de Balleste (2017).Figura 2 - Desenho de uma fração da cobertura do Centro Cultural Max Feffer, Fonte: Das autoras com base nas imagens de Balleste (2017).

Por cima da estrutura, contém (VICTORIANO, 2008) uma das características do bambu por ser um material natural e fibroso, é a baixa resistência às intempéries e ao ataque de insetos se comparado a um material convencional. Por este motivo, todas as peças foram projetadas com encaixes individuais metálicos de forma que os colmos pudessem ser substituídos facilmente conforme fossem se degradando, sem comprometer a segurança da estrutura da cobertura. (BALLESTE, 2017)

Nesta obra diversos materiais foram cuidadosamente selecionados de outras construções e reutilizados para a construção do centro, como tijolos de demolição e caixilhos de madeira de demolição, tudo planejado a partir dos princípios de baixo impacto ecológico, e devido a isso o edifício obteve "25,6%" de redução no consumo energético se comparado com construções convencionais. Leiko informa que “A medida reduziu a quantidade de lixo enviado para aterros sanitários” (VICTORIANO, 2008)

Uma vez que foi a primeira edificação a receber o certificado Leed Gold na América Latina, toda esta estrutura esta associada a um sistema de ventilação cruzada que garante um conforto ambiental sem a necessidade da aplicação do uso de ar-condicionado, garantindo assim uma otimização da energia com uma redução de 38,9%, juntamente com paredes trombe para o aquecimento dos ambientes internos. Aliado a esses benefícios também podemos citar a iluminação natural em 75% dos ambientes, e o uso de recursos como células fotoelétricas na iluminação externa e o sistema de drenagem do terreno que foi mantido e melhorado com a implantação de drenos e árvores de médio e grande porte que garantem a retenção do solo.

Do paisagismo ao edifício tudo foi pensado de forma que a obra pudesse ser inserida no local com uma interferência mínima na natureza de um modo ecológico e sustentável.

 Sistemas construtivos e sustentáveis

Apesar do bambu ser um material abundante na natureza, de acordo com Janssen (2000) é preciso uma mão de obra especializada, uma vez que o material é oco por dentro, possui nós ao longo do seu colmo e seu formato não vem a ser perfeitamente circular, devido a estas dificuldades muitos profissionais da área de construção acabam optando pelo uso de outros materiais mais conhecidos no mercado, e deixando de lado um material com excelentes propriedades mecânicas , muitas vezes por falta de conhecimento.

Nos detalhes 3 e 4 abaixo da cobertura podemos observar o uso de braçadeiras externas  que envolvem o material para conectar o colmo de bambu com as longarinas da cobertura, de acordo com Janssen (2000) esse método é mais moderno e pode ser usado para fixar o bambu utilizando fios de aço ou braçadeiras metálicas.

Figura 3 - Croqui demonstrando a ligação entre o bambu e as longarinas da cobertura.  Fonte: Das autoras com base nas imagens de Balleste (2017).Figura 3 - Croqui demonstrando a ligação entre o bambu e as longarinas da cobertura. Fonte: Das autoras com base nas imagens de Balleste (2017).

Figura 4 - Croqui demonstrando a ligação entre o bambu e as toras de madeira da estrutura.  Fonte: Das autoras com base nas imagens de Balleste (2017).Figura 4 - Croqui demonstrando a ligação entre o bambu e as toras de madeira da estrutura. Fonte: Das autoras com base nas imagens de Balleste (2017).

Neste detalhe 4 da cobertura do Centro Max Feffer podemos observar que a força no colmo de bambu é descarregada para a tora de Eucalipto através da junção entre as peças. A ligação entre o colmo e a tora de Eucalipto estão sendo conectadas por uma haste metálica que segura o interior do bambu e perfura a cumeeira de eucalipto que no final é rosqueada para a fixação do bambu. Por fim se utiliza uma cavilha de eucalipto para a finalização da técnica.

Figura 5 - Croqui demonstrando a junção da fundação de concreto com as toras de Eucalipto.  Fonte: Das autoras com base na imagem fornecida pela autora do projeto.Figura 5 - Croqui demonstrando a junção da fundação de concreto com as toras de Eucalipto. Fonte: Das autoras com base na imagem fornecida pela autora do projeto.

Como mostra a figura acima, em geral nas construções a parte da fundação do projeto são construídas em concreto armado na forma de blocos denominadas de sapatas, onde sua principal função na construção com o bambu é não deixar que o material fique em contato direto com o solo, uma vez que o bambu é um material natural e estar suscetível a pragas e doenças, afetando a resistência e estrutura do material.

Muitas destas sapatas possuem um certo distanciamento do solo para evitar o contato do material com a água da chuva.

O edifício foi projetado para não ter a necessidade de ar-condicionado, por isso todas as janelas são operáveis, para que os usuários posam manipulá-las conforme a necessidade. Somente em uma sala não houve a possibilidade de implementar a ventilação natural, de modo que foi elaborado um sistema de captação de ventilação por meio de dutos enterrados, levando o ar até a sala. (PAIVA, 2010)

Figura 6 - Croqui o sistema de circulação de ar pelo edifício.  Fonte: Das autoras com base na imagem fornecida pela autora do projeto.Figura 6 - Croqui o sistema de circulação de ar pelo edifício. Fonte: Das autoras com base na imagem fornecida pela autora do projeto.

A parede trombe é uma técnica bioclimática, pois minimiza o uso de sistemas ativos como o ar-condicionado. Elas são construídas praticamente com os mesmos conceitos de uma estufa, são paredes de vidro e pedras escuras no seu interior que recebem a maior parte do sol durante o ano, isso possibilita que esquente o ambiente interno no inverno e mantenha fresco no verão, uma vez que as trocas de calor são feitas através de tubos de ventilação no topo e na base da parede, portanto, podemos observar no desenho ilustrado acima, que a parede trombe construída no centro cultural, proporciona um melhor conforto térmico no interior da sala, uma vez que possibilita o aproveitamento do ar que circula entre a fachada e a face exterior da edificação que recebe mais radiação solar. (AECWEB, 2009)

Considerações finais

O bambu é um material acessível e de rápido crescimento e está presente na maior parte do planeta há milhares de anos, considerado um material de características mecânicas extraordinárias e com  capacidade de resistir a esforços de tração e compressão, isso o torna um material potencial concorrente de materiais convencionais, além de ser uma fonte de matéria prima sustentável, pois é um material renovável que incorpora o CO2, portanto pode ser aplicado na minimização dos impactos das mudanças climáticas.

O estudo das técnicas construtivas do bambu no Centro de Cultura Max Feffer nos traz o resgate do caráter vernacular e artesanal do material, buscando valores de modo inovador e tecnológico, assim como a arquitetura tectônica que está ligada com as atividades construtivas de um edifício, explorando as técnicas construtivas e estudos sobre a sua função. Estas características são de extrema importância para a arquiteta Leiko Motomura que projeta com o cuidado com o meio ambiente, e como utilizar as técnicas de uma forma que seja simples manutenção, e sempre se preocupando com a função.

 Sabemos hoje que a construção civil é um nicho onde se utilizam de muitos materiais industrializados não renováveis utilizando materiais primários que acabam gerando uma enorme quantidade de entulhos acabando sendo descartados impactando o meio ambiente, por esse motivo o projeto de Pardinho da arquiteta faz a valorização do bambu em sua obra, com um olhar de destaque sobre materiais sustentáveis. Além de ser um material presente em quase todo o mundo, apresenta características próprias como o fácil cultivo e manuseio, apresenta uma ótima resistência quando utilizadas estruturalmente em construções. Diante deste quadro, por que não se beneficiar desta matéria prima abundante e renovável na construção civil?

Referências

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Vanessa Carolina de Souza

Doutoranda em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, possui graduação em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (2019). Mestrado em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (2021), na linha de pesquisa: Arquitetura moderna e Contemporânea: representação e intervenção, com ênfase nas técnicas construtivas em bambu, com tema: Processos construtivos em bambu em três estudos de caso:Simón Vélez, leiko Motomura e Jaime Peña.

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Célia Regina Moretti Meirelles

Possui graduação em Engenharia Civil pela Universidade Estadual de Maringá (1984), mestrado em Engenharia Civil pela Universidade de São Paulo (1993) e doutorado em Engenharia Civil pela Universidade de São Paulo (1998). Atualmente é professor adjunto I da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Ministra aulas no curso de Arquitetura e Urbanismo para graduação e pós-graduação stricto-sensu. Atua no ensino e Pequisa com ênfase na área de Tecnologia da Arquitetura e Urbanismo, envolvendo temas como processos construtivos, sustentabilidade, estruturas e processos construtivos inovadores. É professora da pós-graduação stricto-sensu desde 2009. E líder do grupo de pesquisa Sistemas construtivos na Arquitetura Contemporânea. Participou do comitê FAPESP - PIPE modalidade Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE). Apresenta pesquisas sobre as comunidades ribeirinhas do Amazonas, em especial sobre produção da habitação, o modo de vida, a cultura. Está inserida em uma rede de pesquisa em conjunto com a UFAM com o grupo Interação, e em conjunto com uma rede internacional para o desenvolvimento da madeira.

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Paula Mendes Thomaz Rimi

Graduada em Arquitetura e Urbanismo na Universidade Presbiteriana Mackenzie (2018). Mestrado em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Presbiteriana Mackenzie com o tema de dissertação "A Madeira na Obra de José Zanine Caldas: Residências no Rio de Janeiro 1968-1979" e bolsista pelo MackPesquisa. Arquiteta no Escritório Bernardes Arquitetura. Estagiária Docente na disciplina de Projeto 06 na Universidade Presbiteriana Mackenzie. Bolsista de Iniciação Científica do CNPq (2016- 2017) com foco em técnicas construtivas industrializadas em madeira e habitação emergencial. Realizou Summer Study Abroad: Architecture na University Of The Arts, Central Saint Martins, Londres (2015).

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Como citar:

SOUZA, Vanessa Carolina de; MEIRELLES, Célia Regina Moretti; RIMI, Paula Mendes Thomaz.  A arquitetura e as técnicas construtivas em bambu: Aplicação no Centro Cultural Max Feffer. 5% Arquitetura + Arte, São Paulo, ano 17, v. 01, n.23, e185, p. 1-17, jan. jun/2022. Disponível em: http://revista5.arquitetonica.com/index.php/periodico/ciencias-sociais-aplicadas/391-a-arquitetura-e-as-tecnicas-construtivas-em-bambu-aplicacao-no-centro-cultural-max-feffer

 

Submetido em: 2021-03-04                  

Aprovado em: 2022-04-06

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